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O acerto de Rosa Weber

Queria o governo que prevalecesse a tática de, na mesma CPI da Petrobras, se investigar também denúncias que pesam sobre o cartel de trens do metrô de São Paulo e do Porto de Suape (Pernambuco), com dois objetivos claramente diversionistas: tirar o foco da Petrobras e esparramar suspeitas contra os adversários que concorrerão com a presidente Dilma Rousseff na eleição de outubro próximo.

Trecho do editorial da Gazeta do Povo desta sexta-feira (25). Leia sua íntegra a seguir:

 

O acerto de Rosa Weber

Se a intenção era a de sonegar à sociedade o conhecimento de fatos que possam embaraçar as ambições eleitorais do PT e seus aliados, a continuidade indefinida das discussões pode lhes causar prejuízos ainda maiores – o velho tiro que sai pela culatra.

“Ainda há juízes em Berlim!”, proclamou – diz a lenda – o agricultor alemão que, vendo-se ameaçado pelos agentes do rei para que doasse ao monarca parte de sua propriedade, depositou sua esperança na Justiça, que seria mais forte para garantir seus direitos e se sobrepor à tirania. Ainda há juízes também em Brasília: a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber enfrentou as pressões do Planalto e sentenciou: se a minoria do Senado conseguiu votos suficientes para instaurar uma CPI exclusiva para investigar desmandos na Petrobras, não pode a maioria enxertá-la de adendos que desfigurem o objeto principal.

A derrota dos governistas já era tida como certa – tão certa que, mesmo antes de se conhecer a liminar de Rosa Weber, já se davam os primeiros passos para não obedecê-la, ou melhor, para não dar-lhe sentido prático. Com a ajuda do sempre solícito senador Renan Calheiros, presidente do Senado, a situação agora manobra para retardar ao máximo a instalação da CPI. Uma das manobras previstas, que pode resultar em debates intermináveis e inclusivos durante semanas, é aquela em que a base aliada não indica membros para compor a comissão; ou, quando indicá-los, passar para outra fase do processo deliberadamente procrastinatório de discutir a que partidos e a que nomes caberão a presidência e a relatoria.

Queria o governo que prevalecesse a tática de, na mesma CPI da Petrobras, se investigar também denúncias que pesam sobre o cartel de trens do metrô de São Paulo e do Porto de Suape (Pernambuco), com dois objetivos claramente diversionistas: tirar o foco da Petrobras e esparramar suspeitas contra os adversários que concorrerão com a presidente Dilma Rousseff na eleição de outubro próximo. De um lado, seriam atingidos os tucanos que apoiam o pré-candidato Aécio Neves; de outro, o ex-governador pernambucano Eduardo Campos, do PSB. Ao fim e ao cabo, sendo tantos os assuntos e sendo tão curto o tempo de duração de uma CPI (120 dias), nada seria de fato investigado.

Bem analisada, a decisão de Rosa Weber apenas explicita o preceito constitucional de que uma CPI deve circunscrever suas investigações a um só e determinado tema. O que, evidentemente, não impede que outras CPIs se instaurem para apurar os supostos malfeitos, indicados pelo PT e seus colaboradores, que teriam ocorrido no metrô paulistano e no terminal portuário de Pernambuco. Mas a inclusão desses assuntos na mesma CPI da Petrobras mais serviria à confusão do que à explicação – explicação essa que é justamente o que mais interessa à opinião pública brasileira, que não consegue entender as razões da escandalosa compra da refinaria de Pasadena, nem o que levou a Petrobras a perder 60% de seu valor de mercado em apenas dez anos.

A estratégia diversionista intentada pelo governo poderá, no entanto, ser-lhe mais fatal do que se, desde logo, tivesse optado pela transparência e pela obediência aos princípios constitucionais e à jurisprudência que regem o processo de criação de CPIs. Se a intenção era a de sonegar à sociedade o conhecimento de fatos que possam embaraçar as ambições eleitorais do PT e seus aliados, a continuidade indefinida das discussões pode lhes causar prejuízos ainda maiores – o velho tiro que sai pela culatra.

Não importam, todavia, os ganhos e perdas a serem contabilizados pelas facções políticas, de um lado ou outro. O que mais importa ao Brasil – e a CPI exclusiva pode contribuir muito para isso – é resgatar o mínimo de moralidade e responsabilidade no trato da coisa pública.

 

Gazeta do Povo, 25 de abril de 2014 – Editorial

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