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Golpe às ruas

Ao contrário dos movimentos sociais oficiais, patrocinados com dinheiro público, os milhares que vão as ruas neste domingo não têm tutela de ninguém

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Mary Zaidan

Dilatação do prazo para o julgamento das pedaladas fiscais, pedido de vistas protelatório no TSE, manifestações de apoio, Agenda Renan. Acertados por debaixo do pano, os arranjos da semana passada foram um alento à presidente Dilma Rousseff. Mas não parecem ser suficientes para dar fôlego ao seu governo, rechaçado por 71% da população. Os ares das ruas – com panelaços e manifestações – que o digam.

Ao contrário dos movimentos sociais oficiais, patrocinados com dinheiro público, os milhares que vão as ruas neste domingo não têm tutela de ninguém. Nem a mesma palavra de ordem previamente ensaiada. Seus gritos de Fora Dilma, Fora PT traduzem uma gama de insatisfações. Do caos econômico ao desemprego, dos privilégios de alguns aos conchavos para proteger os mesmos de sempre. Reagem à roubalheira, aos saqueadores do Estado.

Repudiam a corrupção. Algo que em instante algum se ouviu dos líderes do MST, CUT, UNE e outras entidades no convescote do Planalto, quinta-feira, apelidado de Diálogo. Para eles, que prometem defender com unhas, dentes e até armas qualquer tentativa de “golpe”, que só eles enxergam, Mensalão não existiu, Lava-Jato é invenção, José Dirceu não está preso, Dilma não era ministra e presidente do Conselho da Petrobrás quando a roubalheira tomou conta da estatal. Lula não era presidente da República.

Um mês antes do início da Lava-Jato, em fevereiro de 2014, a Petrobras fechou, sem licitação, contrato de patrocínio do Congresso Nacional do MST, realizado em Brasília. A estatal confirmou ter colocado R$ 650 mil no evento. Outros R$ 550 mil foram custeados pela Caixa e pelo BNDES. Para as “margaridas” que ouviram os arroubos de Lula e Dilma no Mané Garrincha, Caixa, BNDES e Itaipu Binacional gastaram mais de R$ 850 mil.

Dinheiro pequeno perto de generosidade permanente com o MST, gestor de convênios de mais de R$ 200 milhões, de cuja prestação de contas não se tem notícia. Perde para a CUT, que de 2008, quando Lula incluiu as Centrais na partilha dos recursos do imposto sindical – um dia de trabalho de cada assalariado – para cá arrecadou mais de R$ 340 milhões. Recursos suficientes para custear muitas guerras.

A UNE abocanhou R$ 57 milhões para a reconstrução de sua sede, no Rio, e outros R$ 12,9 milhões em convênios questionados pelo TCU.

Dinheiro público empenhado para cooptar movimentos sociais. Reconheça-se, que eles retribuem sempre que o governo solicita. Mas ainda pedem ajuda de custo – transporte e lanche – para formar a claque.

Descem a rampa interna do Planalto ao lado da presidente aos gritos de “não vai ter golpe” – como se o Palácio estivesse cercado por canhões -, rechaçam o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e Eduardo Cunha, pouco se lixando se ele preside a Câmara dos Deputados. Fazem tudo estimulados por Lula e o PT, sem qualquer reprimenda.

Sob o manto do diálogo, pregam o litígio. E chamam de golpistas quem vai às ruas.

Em entrevista a Serginho Groisman nos tempos em que liderou movimentos pró-impeachment de Collor de Mello, Lula explicou aos jovens que a Constituição previa a destituição de um presidente. Foi mais longe: defendeu o recall do voto – “seria a salvação da lavoura”. Hoje, na sua doutrina impeachment é golpe.

Dilma respirou. Depende ainda de aparelhos, materializados em movimentos sociais pagos e políticos encrencados. Pode ir mais longe – ou não.

As dívidas dela com as ruas são maiores. Não adianta tentar golpeá-las.