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Exigências da China impõem mais um ônus para o produtor de soja

O grão de soja brasileiro é um dos melhores do mundo em qualidade de óleo e proteína

Nelson Fernando Padovani

No comércio, há um dito popular que o cliente sempre tem razão. Mas será que essa máxima se aplica ao mercado internacional de commodities? Vamos contextualizar: a China, a maior compradora da soja brasileira, entre outros produtos do agronegócio, exige mais qualidade do grão importado. Na prática, estabeleceu parâmetros mais refinados para teores de óleo e proteína e menor índice de umidade.

O assunto ainda está na mesa de debate, com chineses de um lado e brasileiros do outro, com a participação do Ministério da Agricultura, Confederação da Agricultura e Pecuária e técnicos da Embrapa, nossa renomada empresa de pesquisa na área de agronegócio. A discussão tem avançado no sentido de revisão das normas em vigor desde 2009, mas ainda esbarra em obstáculos que expõem o produtor.

Os chineses não cobram apenas mais qualidade interna do grão, mas também a externa, o que implica na sua integridade, ou seja, o grão não deve apresentar avarias aparentes. Há muitos detalhes nessa negociação, mas as exigências dos asiáticos apertam ainda mais o produtor, que será obrigado, por exemplo, a reduzir a umidade no grão, dos atuais 14% para 13%, sob pena de ter o produto desvalorizado no momento da entrega.

Em relação à qualidade interna da soja brasileira, a implicação chinesa, que importa cerca de 50 milhões de toneladas de soja do Brasil por ano – a demanda interna do país é de 100 milhões de toneladas –, não incomoda tanto os produtores. O grão brasileiro é um dos melhores do mundo em qualidade de óleo e proteína. Em proteína, estamos próximos dos 40%, sendo que a escala vai de 40% a 44% em enquadramentos da qualidade de 1 a 3, com média de 38% nas principais regiões produtoras.

Com relação ao óleo, o produto nacional já supera a exigência chinesa com percentual de 20% a 22% na escala de 1 a 3 de qualidade interna do grão. Comparando com a soja norte-americano, outro fornecedor importante da China, a oleaginosa brasileira é pelo menos 2% superior na equivalência por tonelada na avaliação qualitativa. Mas pecamos na integridade dos grãos, com avarias perceptíveis próximas de 30% em muitos casos – a tolerância é de 8%.

Apesar da exigência sobre a aparência do grão, extensiva a outros compradores, asiáticos ou não, não há relação entre a forma do grão e a qualidade do produto acabado, ou seja, a conversão da oleaginosa em ração, destino principal da soja brasileira no mercado chinês. Ainda assim, a avaria de grãos é preocupante, assim como as perdas que ocorrem “da porteira para fora”, um problema que impacta em toda a cadeia produtiva.

A cada safra estima-se em 1,6 milhão de toneladas as perdas contabilizadas no deslocamento do campo aos armazéns, com grãos perdidos em estradas mal conservadas e esteiras transportadoras abertas. Esse processo também provoca avarias nos grãos e o mercado, cada vez mais seletivo, vai exigindo dos produtos nível de cuidados extremo, sem a contrapartida da compensação.

Se o produtor entregar soja com menos umidade e mais integridade dos grãos, seria justo que fosse remunerado por isso.

Exigências da China impõem mais um ônus para o produtor de soja

Nelson Fernando Padovani é produtor na região Oeste do Paraná.

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