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Estudo revela que mais de cem unidades de conservação na Amazônia estão ameaçadas

(FILES) In this file photo taken on September 22, 2017 Aerial view of deforestation in the Western Amazon region of Brazil. - Brazilian far-right presidential candidate Jair Bolsonaro’s declarations on the environment are a source of deep concern among activists who fear that the Amazonia, the "lung of the planet," will be sacrificed for the interests of agribusiness. (Photo by CARL DE SOUZA / AFP)

 

Na Amazônia, 110 Unidades de Conservação (UCs) estão ameaçadas por projetos de infraestrutura, 219 têm processos ativos relacionados à mineração e 14 podem ser afetadas por projetos de geração de energia. A lista de ameaças fica completa com desmatamento e crescimento de propriedades privadas.

Quem diz isso é um estudo da WWF-Brasil que analisou todos os processos de recategorização, redução ou extinção de unidades de conservação na Amazônia, eventos conhecidos pela sigla, em inglês, PADDD (Protected Areas downgrading, downsizing, and degazettement). A pesquisa levou em conta as 316 UCs federais e estaduais da Amazônia que protegem aproximadamente 1,4 milhão de km². Em alguns casos, a mesma UC se encaixa em mais de uma ameaça.

Os projetos de infraestrutura são os que representam a maior ameaça por área, com cerca de 30 mil km² em UCs ameaçados.

A mineração ameaça área superior aos 4.000 km² -considerando requerimento de mineração em UCs de proteção integral, autorização para pesquisa mineral e áreas já com direito à extração de minérios.

Mesmo assim, a mineração é uma preocupação maior para Mariana Napolitano, coordenadora do programa de ciência da WWF e autora do estudo, por conta do grande número de processos minerários em andamento -quase 13 mil- e pela dificuldade de mapeamento das ações.

Em maio, reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostrou que a Agência Nacional de Mineração (ANM) vinha liberando projetos de mineração em UCs no Pará. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), há focos de garimpo nas Florestas Nacionais (Flona) de Itaituba 1 e 2, e de Trairão, o que causa danos ambientais aos locais. O MPF pediu a paralisação urgente das atividades de garimpo.
“Se não sentarmos e planejarmos juntos vamos ficar em conflito para sempre. É uma ameaça a um patrimônio estabelecido [UCs] e que demorou anos e investimento público para se formar. E também não é interessante para os setores, porque com sobreposições de UCs começam processos demorados, além de ser um ponto de atenção para investidores”, afirma Napolitano.

Já Roberto Palmieri, gestor do programa florestas de valor do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), considera a infraestrutura um fator crítico de ameaça às UCs. Segundo o pesquisador, muitas vezes há um discurso que a infraestrutura consegue, por conta própria, resolver problemas.

“Essa visão pode levar a conflitos, degradação e não necessariamente trazer benefícios para as populações locais”, afirma Palmieri. O pesquisador, que não participou do estudo da WWF-Brasil, diz que é comum a ideia de uma falsa dicotomia entre proteção e produção.

Para o desmatamento em UCs -que costuma ser usado como justificativa para tentativas de redução das áreas-, os pesquisadores da WWF analisaram os dados do Prodes, que são as informações oficiais usadas pelo governo. Segundo a pesquisa, 18 UCs apresentam desmatamento em mais de 50% de sua extensão.

Segundo Palmieri, a falta de ação do governo em políticas e incentivos para atividades compatíveis com as unidades de conservação também favorecem ameaças, por meio de atividades ilegais, nas áreas protegidas.

Outro ponto levantado pelo estudo e que chama a atenção é a elevada presença de propriedades privadas dentro de terras protegidas. Em 29 unidades de conservação -entre elas uma de proteção integral e as outras de uso sustentável, áreas em que coexistem conservação e uso de recursos naturais- em 100% da área há sobreposição com registros de imóveis rurais privados. Outras 22 têm mais de 90% de suas áreas com sobreposição de propriedades -duas delas de proteção integral.

Segundo a pesquisa, somente 28 das 316 unidades de conservação não têm nenhum imóvel registrado em sua área.

A análise levou em conta os dados do CAR (Cadastro Ambiental Rural), registro que proprietários rurais precisam fazer para ter suas terras regularizadas e em consonância com o Código Florestal.
“Precisamos tomar cuidado ao analisar o CAR, porque ele pode ser legítimo ou não. Como ele é autodeclaratório, é possível ter proprietários declarando CAR dentro de uma UC porque ele não foi regularizado e compensado, mas também há casos de registros de CAR de posseiros e grileiros. A dificuldade é separar o joio do trigo”, diz a especialista da WWF-Brasil.

Os estados do Amazonas e do Pará são os que concentram a maior parte das unidades de conservação em risco, com respectivamente 25 e 22 terras protegidas.

O estudo da WWF-Brasil levou em conta o Plano Nacional de Logística (PNL), o Plano Decenal de Energia 2026, dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), informações do TerraClass e do Prodes.

As ameaças apontadas não necessariamente irão se concretizar, mas a ideia do estudo é alertar para os processos em andamento.

Recentemente,o Ministério da Infraestrutura encaminhou para o ICMBio um parecer com o levantamento de todas as áreas protegidas que supostamente interferem na malha de transportes brasileira. A ideia do governo Bolsonaro, segundo matéria do jornal O Estado de S.Paulo, seria reduzir essa UCs.

Uma matéria recente da Folha de S.Paulo também mostra que o Brasil concentra retrocessos em unidades de conservação, com 146 áreas protegidas reduzidas, removidas ou com status de proteção rebaixado desde 1961.

Napolitano afirma que o Parque Nacional do Jamanxim, a Reserva Extrativista (Resex) Jaci Paraná e o Parque Nacional dos Campos Amazônicos estão entre as unidades de conservação mais ameaçadas.
“Se sempre que tivermos um conflito a única resolução for a redução de terras protegidas, temos uma área enorme a ser perdida na Amazônia”, diz a pesquisadora.

Procurado pela reportagem, o Ministério do Meio Ambiente não havia se manifestado até a publicação dessa reportagem.

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