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CÉSAR BENJAMIN DÁ PISTAS DA SOLUÇÃO DO ENIGMA BRASILEIRO

CÉSAR BENJAMIN DÁ PISTAS DA SOLUÇÃO DO ENIGMA BRASILEIRO

O sucesso da Escola de Formação Política levou os organizadores a abrirem já inscrições para a segunda turma, com início no segundo semestre deste ano. Também foi definido a criação de novos módulos, mais avançados, para os participantes da primeira turma que se formam no dia 4 de agosto. E escola é um projeto conjunto do PMDB do Paraná, da Fundação Pedroso Horta e do Idesp (Instituto de Desenvolvimento Sócio-político).

A aula inaugural aconteceu nesta sexta-feira, 25, à noite, no Diretório do PMDB, com uma palestra do cientista político César Benjamin. A abertura contou com a presença do presidente do PMDB, Renato Adur, do secretário-geral, João Arruda, um dos idealizadores do projeto, do presidente da Fundação Pedroso Horta, José Maria Correia, do representante do Idesp, Alessandro Panassolo, da secretária de Cultura, Vera Mussi, do presidente do PCdoB do Paraná, Milton Alves, e, principalmente, dos alunos que esgotaram as 70 vagas do curso.

Benjamin foi candidato a vice-presidente pelo Psol e vinha evitando declarações e eventos públicos. Na última semana, uma série de coincidências levou-o a participar de debates e a realizar palestras em diversos estados, culminando com o encontro em Curitiba. Esteve em Porto Velho (RO) falando sobre a crise no sistema elétrico brasileiro, em Ji-Paraná (RO) para debater a Amazônia Meridional, em Brasília (DF) num encontro sobre Segurança Nacional e em Florianópolis (SC) em um evento de engenheiros sobre novas tecnologias. Veio de carro da capital catarinense direto para a sede do PMDB.

“Estava em silêncio e há cinco dias não paro de falar”, disse no início da palestra. A principal do razão do silêncio de Benjamin é o reconhecimento de que sua geração de intelectuais, nascidos entre os anos 50 e 60, não soube dar uma resposta aos desafios do Brasil nas décadas seguintes e de que os economistas, a maioria formados nos Estados Unidos, dominaram o cenário intelectual e do debate político do país. “Minha geração não soube atualizar a teoria de Brasil”, declarou.

A razão de tantos convites e de estar falando tanto pode ser explicada pelas platéias. A de Curitiba era formada por algumas dezenas de militantes, dirigentes partidários, dois prefeitos da Região Metropolitana, vereadores, pré-candidatos em futuras eleições, assessores parlamentares e, em maior número, estudantes, todos em busca de resposta para a pergunta que Benjamin faz: “Porque o Brasil, o país que mais cresceu no mundo entre os anos 30 e 60, está ficando para trás?”

O cientista político, que também é economista, mostra as razões do fracasso e dá algumas pistas para sua solução:

1ª Os intelectuais não souberam dar prosseguimento ao pensamento desenvolvimentista e nacional das gerações anteriores, cujos expoentes participavam da elite mundial. Do conservador Gilberto Freire aos engajados Celso Furtado, Caio Prado Júnior e Darcy Ribeiro, passando por Sérgio Buarque de Holanda e Raimundo Faoro, todos eles debruçaram-se sobre o Brasil, os brasileiros e sob uma lente brasileiríssima. “Não soubemos dar prosseguimento ao pensamento da geração de intelectuais desenvolvimentistas”, analisa Benjamin.

2ª Os economistas – aqueles formados lá fora, que não se debruçam sobre a realidade do Brasil e que utilizam os chamados modelos macroeconômicos que ignoram o território e a população – ocuparam um espaço abusivo no cenário intelectual.

3ª O Sistema Financeiro que assumiu o comando da acumulação de capital no país e no mundo globalizado não tem o mesmo tempo da nação. As aplicações financeiras não podem esperar pelas decisões de longo prazo, pois dependem de resultados imediatos.

4ª O Brasil não construiu um mega-estado como os EUA, a China, o Japão e a Comunidade Europa para fazer frente ao capitalismo transnacional. “Quem acreditou na ideologia da redução do Estado, no Estado-mínimo, são os perdedores, como Brasil, Argentina, México e Rússia”, afirmou.

A respeito da importância do Estado, das decisões de longo prazo e dos projetos estratégicos, Benjamin considera que a criação da Petrobrás por Getúlio Vargas, em 1953, foi a decisão isolada que maior influência exerceu e exerce sobre a economia brasileira. “Graças a Petrobrás passamos de uma produção de apenas 20% na crise do petróleo de 1982 para a auto-suficiência. Sem a empresa, com o petróleo na casa dos US$ 60 o barril, se tivéssemos que importar a economia brasileira não existiria hoje”, sentenciou.

Completando a análise da economia e da sociedade Benjamin destaca que o Brasil, ao contrário do que se pensava, ao estender sua fronteira agrícola, que chega ao limite às portas da Amazônia, não promoveu democratização da posse da terra. Pelo contrário, a concentração da propriedade nas novas fronteiras acentuou-se.

Outro aspecto, a mobilidade social existente nos anos de crescimento que atingia todas as classes apesar da concentração de renda diante do vigor do desenvolvimento, é nula para a população que vive na periferia das grandes cidades, que hoje é maioria. Pior, na classe média, a mobilidade é descendente. Ou seja, a maior parcela do povo brasileiro não tem perspectivas de melhorar de vida. Está aí uma, talvez a principal, das causas da violência.

Para completar o cenário, Benjamin faz duas declarações de Celso Furtado. A primeira ilustra a atual fase de crescimento pífio dos governos Fernando Henrique Cardoso e medíocre do primeiro mandato de Lula: “Nunca foi tão grande a distância entre o que somos e o que podemos ser”. A segunda é uma revelação. Diante da hegemonia do sistema financeiro, da desorganização do Estado e do quadro social, pouco antes de sua morte o economista disse a Benjamin que temia a fragmentação do território brasileiro.

Mas nem tudo é desanimador no que ele chama de “enigma brasileiro”. Ao mesmo tempo em que, segundo levantamento feito por ele, entre 2000 e 2006 não criamos, em termos líquidos, nenhum emprego com mais de três salários mínimos, somos o único país de 3º mundo que concluiu o ciclo industrial até o fim ou seja, projetamos, construímos e operamos máquinas que fabricam máquinas, as máquinas-ferramenta. Temos recursos naturais (minerais, hidrelétricos, biomassa, climáticos etc), identidade nacional e capacidade criativa entre tantas vantagens competitivas.

Por tudo isto, Benjamin diz que não é pessimista. Mas o que ele busca é o “otimismo filho do projeto, não o otimismo do marketing”. Como idéia de projeto, Benjamin considera que a superação de problemas sociais graves como garantir escola, moradia e alimentação para todos é o menos difícil.

De forma resumida, sua proposta de projeto consiste em repetir o esforço endógeno que tivemos a partir dos anos 30, com a recuperação da capacidade do Estado de induzir o desenvolvimento e de elaborar programas estratégicos, e da sociedade demonstrar seu potencial cultural, quem sabe para mostrar para o mundo que a criatividade, a miscigenação, tolerância e alegria do povo brasileiro poderá dar início a um novo processo civilizatório.