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A lição das ocupações

A mensagem mais perniciosa que os estudantes poderiam aprender em um momento como este é a de que as questões políticas se resolvem pela força e pela chantagem

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Editorial, Gazeta do Povo

Os estudantes do ensino médio costumam ter entre 15 e 18 anos – uma idade de amadurecimento e de muitos primeiros passos na vida em sociedade, que vão da habilitação para dirigir ao direito de votar. A ocasião ideal para que esses jovens compreendam seus direitos e responsabilidades, descubram o que podem realizar com seu potencial e o que deveriam esperar (e cobrar) do poder público. Enfim, aprender os valores democráticos e sua importância para que essa nova geração, que já adentra o mercado de trabalho ou se prepara para a vida profissional, também seja responsável por uma evolução cívica na vida nacional. Em vez disso, os jovens que ocupam cerca de cinco centenas de escolas no Paraná estão recebendo uma lição que poderíamos chamar de anticívica, para não dizer autoritária.

Louve-se a disposição dos estudantes de desejar que sua voz seja ouvida no momento em que o governo anuncia uma reforma do ensino médio, com seus pontos positivos e negativos e apesar da maneira equivocada como foi apresentada, por meio de medida provisória. Ressalte-se também que não há registros de depredação nas escolas, ao contrário de diversas ocasiões em que estudantes universitários deixaram rastros de destruição em reitorias de universidades públicas Brasil afora. Mas o movimento dos secundaristas, ainda que afete um número menor de escolas em comparação com a greve anunciada pelos professores da rede estadual, tem um peso que não pode ser menosprezado.

E a mensagem mais perniciosa que os estudantes poderiam aprender em um momento como este é a de que as questões políticas se resolvem pela força e pela chantagem. Ao impedir o funcionamento das escolas, os manifestantes resolveram prejudicar um sem-número de colegas, bloqueando-lhes o direito à educação e ignorando que o fim do ano é um período especial para os estudantes do terceiro ano do ensino médio, que veem chegando os vestibulares e o Enem. Ora, por mais errado que esteja o governo federal ao propor a reforma por medida provisória, ela ainda exige a apreciação do Congresso. O autêntico caminho democrático, que é a pressão sobre os representantes do povo, é ignorado e substituído pela tentativa de vencer no grito ou pelo cansaço.

Some-se a isso a desinformação, já apurada pela própria reportagem da Gazeta do Povo , entre os estudantes sobre o teor da reforma, e a manipulação da informação, pois vários itens hoje defendidos pelo Planalto já foram parte, em outras épocas (leia-se durante o governo do PT) da pauta das entidades do movimento estudantil, ávidas por se apropriar do movimento. A União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (Upes), por exemplo, que no início definia as ocupações como movimentos espontâneos dos estudantes, já tomou a dianteira, a ponto de seu presidente dar entrevistas coletivas sobre o protesto e se apresentar como interlocutor para o diálogo com o governo estadual.

Essas entidades, no fim, veem no idealismo dos jovens o campo fértil para arregimentar massa de manobra para o “fora, Temer”, já que a bagunça foi a única estratégia que restou à esquerda depois do impeachment e do desastre eleitoral de 2 de outubro. A bandeira vermelha, com a foice e o martelo, hasteada no Colégio Estadual do Paraná mostra que o ensino médio está sendo usado como pretexto para um objetivo mais amplo, político-partidário. No fundo, não é só sobre o ensino médio – e talvez nem seja sobre o ensino médio.

Se nas escolas do Paraná a mensagem que prevalecer for a do predomínio da força sobre a negociação, do desrespeito aos direitos dos demais, da recusa ao diálogo pelos canais democráticos, aquilo que o movimento estudantil chama de “primavera secundarista” não passará de uma “primavera autoritária” – uma triste iniciação política para tantos jovens.