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O desabafo de Joice Hasselmann

“Meu irmão mutilado por um erro médico em PG se tornou parte de uma triste estatística

O que mais ouvi nessas últimas horas foi a frase: “chorei junto com você”. A demonstração de sensibilidade dos que me acompanham todos os dias pelos microfones da BandnewsFm veio imediatamente após o desabafo emocionado que fiz sobre o caso do meu irmão caçula, um jovem cheio de vida e saúde, que foi mutilado por causa da negligência, do erro, da desumanidade de um médico do Pronto Socorro de Ponta Grossa.

O nome dele: Edegardo Estrada Arameda, inscrito no CRM 14 750. Não foi fácil decidir por contar parte da intimidade da minha família, mas era preciso relatar essa história de horror que marcou meu irmão para sempre.

Infelizmente agora o caso, ou melhor, descaso envolvendo meu irmão, virou um número, parte da triste estatística, assim de como outros homens, mulheres e crianças. Se nada mudar outros virão das fábricas de produzir vítimas, como é o hospital que atende quem precisa do SUS em Ponta Grossa.

Emerson, meu irmãozinho caçula tem 19 anos. É do tipo bom menino, filho e irmão que nunca dá problema. Ex-atleta de ciclismo tem um único vício: os carros antigos. Na garagem vive as voltas com uma Caravam literalmente caindo aos pedaços. Foi na tentativa de remontar sua máquina do coração que no último domingo aconteceu um acidente.

Enquanto martelava uma peça da caranga velha um pedaço pequeno de ferro se soltou e atingiu o olho direito do menino. O olho foi perfurado, houve descolamento de córnea e hemorragia. Como a dor era grande ele foi ao Hospital Municipal. E ali naquele inferno começou mais uma das tantas tragédias da saúde pública brasileira. Com muita má vontade o doutor Edergardo deu seu decreto.

Mandou que meu irmão tomasse um Paracetamol e o dispensou, afinal era domingo à tarde, então para que se esmerar pela vida de alguém? Bem, poucas horas depois o óbvio aconteceu. A dor era incontrolável e veio seguida de vômito e inchaço na face.

Minha família desesperada procurou outro médico, na segunda-feira bem cedo, dessa vez um profissional de um hospital particular. O doutor sequer quis atender o caso tamanha gravidade. Devolveu o dinheiro da consulta e encaminhou Emerson a um especialista que o atendeu como se devia. Imediatamente pediu exames e deu laudo indicando cirurgia. Era muito grave. A infecção havia se espalhado.

Então começou uma nova saga, agora contra a burocracia. Ele que estava com minha mãe foi à Regional de Saúde. Lá mandaram os dois para a ouvidoria que empurrou o caso a Central de Atendimento à Saúde.

Depois de muita pressão veio o atendimento. O médico que o atendeu, doutor Wagner Alves Costa, CRM 11 356 relatou o que já imaginávamos. O tal Edegardo não fez o procedimento adequado. Mas era tarde. Meu irmão foi internado e, sem recurso algum em Ponta Grossa, transferido para Curitiba.

Algumas horas depois, já na Capital, nas mãos do doutor Rafael Ferré e da equipe qualificada do Hospital de Olhos, veio a triste notícia. Teriam de eviscerá-lo, ou seja, extrair o olho para salvar a vida. A infecção já tinha se espalhado pelo corpo e sem a cirurgia seriam poucas horas de vida.

Tudo tinha que ser feito muito rápido. Bem…meu mano está sem um dos olhos, mutilado e ainda internado sob os cuidados, agora, da equipe preparada do Hospital Evangélico tomando antibióticos fortíssimos para controlar a infecção. No lugar onde havia um lindo olho verde, que sempre expressou alegria e vitalidade, há um buraco vazio. Ainda temos medo de perdê-lo, mas temos fé que o pior já passou.

Também há um buraco vazio na minha alma, na alma da minha mãe, do meu pai, da minha irmã e dos amigos. Tudo isso com um profundo sentimento de indignação misturado com tristeza, afinal como pode alguém entrar com um ferimento no olho e quase perder a vida?

Como pode haver um número gigantesco de vítimas de uma pseudo-medicina aplicada por gente que comete tentativa de homicídio usando guarda-pó branco e achando que está cima de Deus? Esse doutor Edegardo Estrada Arameda vai encontrar em seu caminho a justiça e responder criminalmente por tudo que fez.

Certamente doutor desejo com todas as minhas forças e vou trabalhar para que você seja banido da profissão, não apenas por causa do meu irmão que quase matou, mas para preservar outros que podem ser vítimas pelas suas mãos.

Os burocratas da saúde em Ponta Grossa são co-responsáveis pela barbárie que tem acontecido na cidade. Alguém precisa fazer alguma coisa. Alguém precisa ouvir o pedido de socorro dessa população.

Durante as últimas horas li centenas e centenas de relatos de pessoas que como eu e minha família passaram por momentos de horror nas mãos de maus profissionais e que tiveram a sorte de encontrarem antes da morte outros médicos que fizeram papel de anjos no caminho; me emocionei com muitas delas.

E a cada nova mensagem agradeço por ter tido tempo de encontrar uma equipe de profissionais que puderam salvar a vida do meu mano. Lamento profundamente por todos aqueles que não conseguiram.

A todos vocês que fizeram orações para que meu irmãozinho caçula se salvasse, que enviaram mensagens de apoio, que dedicaram parte do seu tempo e de seu carinho para um caso tão pessoal eu só tenho a agradecer. É incrível como essa solidariedade transmite força e fé.

Quanto a você meu irmão, sei que vai superar isso. Sei por que te conheço, afinal um menino que ganhou medalhas como atleta depois de andar um ano de cadeira de rodas e sem perspectiva de voltar a andar é um vencedor. Você é guerreiro e vai vencer mais essa…eu sei que vai….

Joice Hasselmann