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1 quadrilha a cada 5 quilômetros

Tragédia na fronteira
1 quadrilha a cada 5 quilômetros

Os 200 quilômetros do Lago de Itaipu, entre Guaíra e Foz do Iguaçu, são disputados por 40 grupos criminosos

Guilherme Voitch

Guaíra – Quarenta grupos criminosos atuam nos cerca de 200 quilômetros do Lago de Itaipu, na divisa do Brasil com o Paraguai, entre Guaíra e Foz do Iguaçu. A informação é do delegado-chefe da Polícia Federal (PF) em Guaíra, Érico Saconato. “Levantamentos feitos pela nossa inteligência indicam que seriam 20 quadrilhas mais próximas de Guaíra e outras 20 com sede mais para o lado de Foz. O poder criminoso está diluído e não existe um grande chefão”, explica.

Segundo o delegado, “o mercado consumidor” de contrabando, de drogas e de armas permite a co-existência das atividades das quadrilhas. De quando em quando, porém, uma invade o território da outra, ou rouba sua mercadoria. Aí a disputa passa a ser resolvida com a força das armas. Foi essa disputa que originou a maior chacina da história do Paraná, ocorrida na última segunda-feira, quando 15 pessoas foram mortas em uma chácara no bairro de Santa Clara, às margens do Lago de Itaipu, em Guaíra.

A cidade, com 30 mil habitantes, tornou-se a opção mais fácil de passagem para o tráfico e o contrabando desde a instalação da Aduana 100% em Foz, há dois anos. Carregamentos, que antes saíam pela região de Foz, migraram para Guaíra. O número de apreensões realizadas pela Polícia Federal em Guaíra comprova esse aumento (veja quadro ao lado). De 2006 para 2007, a PF passou a apreender mais drogas, armas e veículos. Em 2008, o ritmo de trabalho continua intenso. Faltando três meses para o fim do ano, a delegacia já abriu mais inquéritos do que em todo ano de 2006 ( 233 contra 217).

No entanto, de acordo com o próprio delegado Saconato, a estrutura do crime tem conseguido, na maioria das vezes, driblar a fiscalização. “Quando saímos daqui da delegacia para colocar uma lancha no rio, já começam os foguetes para avisar o lado paraguaio”, explica.

No transporte pelo lago, os contrabandistas utilizam batelões (barcos rápidos, movidos com motores de veículos a gasolina) e barcos de pescadores tradicionais cooptados para o contrabando.

As dificuldades não param por aí. É a delegacia da PF em Guaíra que está responsável pelo policiamento em Mundo Novo, no Mato Grosso do Sul, município que também faz divisa com a cidade paraguaia de Salto Del Guairá. Se em Guaíra a situação é crítica, na cidade do Mato Grosso, diz Saconato, a previsão é de caos. “Do jeito que está a coisa ali, caminha para um faroeste.”

Com uma fronteira seca desprotegida, sem presença efetiva de policiais e com vastas áreas de matagal, a travessia de um país para o outro é facilmente feita. Mundo Novo é um oásis para os contrabandistas. Um novo shopping de compras está sendo construído em Salto, a 500 metros da aduana paraguaia, em uma região distante do centro, mostrando o aumento da demanda dos compradores na região. Informações obtidas pela Gazeta do Povo indicam que o shopping estaria sendo construído por familiares de Law Kim Chong, considerado o maior contrabandista do país. Terrenos próximos ao shopping tiveram seu valor de mercado inflacionado nos últimos meses. Um alqueire na região custava US$ 4 mil no fim do ano passado. Atualmente, custa US$ 80 mil. “A valorização dos terrenos indica que o centro comercial de Salto, próximo da fronteira com Guaíra, está se deslocando para a divisa com Mundo Novo. Isso nos preocupa”, explica Saconato.

Ele lembra que a delegacia da PF mais próxima está em Naviraí, no Mato Grosso do Sul, 150 quilômetros distante. “Isso nos causa uma série de problemas burocráticos”, conta. Se prende um suspeito em Mundo Novo, Saconato não tem como deixá-lo preso na sua delegacia, que está interditada. Também não pode pedir auxílio à Polícia Civil, que recusa o preso, já que o mesmo foi detido em outro estado. “A Procuradoria da República em Umuarama, a qual a delegacia está subordinada, também se queixa de escutar uma pessoa que, em teoria, deveria ser ouvida em Naviraí”, diz. (Colaborou Ari Silveira)