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PR: defesa de ex-assessor qualifica supostas vítimas como prostitutas

Carlos Ohara, no portal Terra

A defesa de Eduardo Gaievski – ex-assessor especial da ministra Gleisi Hoffmann e membro titular do grupo executivo do programa Mais Médicos do governo federal, preso na última semana em Foz do Iguaçu (PR) sob acusação de estupro de vulnerável – pretende argumentar, entre outros pontos, que as supostas vítimas, entre elas meninas de 12 anos, teriam maturidade precoce e estariam aptas a evitar qualquer constrangimento ilegal por parte do acusado, “inclusive porque lhe era perfeitamente possível resistir, sem mais, ao ato”.

A estratégia foi apresentada no pedido de liminar para soltura de Gaievski. Os advogados do acusado afirmam que “as supostas vitimas recebiam valores em troca de favores sexuais, ou seja, já haviam iniciado a vida sexual, tanto que chegaram ao ponto de se prostituir”.

Na prática, segundo juristas ouvidos pelo Terra, os defensores de Gaievski pretendem convencer o Judiciário que as adolescentes supostamente teriam praticado sexo consensualmente com Gaievski, atuando como prostitutas.

A tese não foi analisada no julgamento do pedido de habeas-corpus no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). O relator do caso, desembargador Luiz Carlos Gabardo, assinalou que a análise do tema não caberia no exame do pedido da liminar e, em decisão no último dia 30, manteve a prisão preventiva de Gaievski, concordando com a decisão inicial do juiz de Realeza (PR), que decretou a prisão do ex-assessor da Casa Civil alegando que “há fortes indícios de que o acusado tem a personalidade completamente voltada à prática de crimes sexuais contra adolescentes, preferencialmente menores de 14 anos de idade (…) tudo demonstrando que, caso solto, continuará na empreitada criminosa”.

Ao revelar que houve pagamento para encontros com as menores, a defesa de Gaievski desmentiu a entrevista do ex-assessor da Casa Civil concedida à revista Veja, quando ainda era procurado pela polícia.

Questionado sobre a acusação de adolescentes de que teria pago por favores sexuais, Gaievski afirmou à publicação que “jamais” fez isso. O assessor também negou as acusações ao ser indagado sobre a mesma questão pela imprensa ao ser apresentado em Curitiba na semana passada após ser preso.

Na entrevista à Veja, Gaievski disse que era vítima de uma perseguição da promotora e do delegado que atuavam na cidade e disse que haviam “armado” contra ele, sugerindo que as acusações haviam sido forjadas.

Ele chegou a afirmar: “Duvido que tenham conseguido arrumar 20 adolescentes contra mim”. O desembargador que analisou o pedido de habeas-corpus de Gaievski anotou que o ex-assessor tinha 31 denúncias contra ele por suposta prática de crimes sexuais.

Revolta
A alegação da defesa causou revolta no pequeno município de Realeza, onde Gaievski foi prefeito entre 2005 e 2012. Vereadores da cidade ouvidos pelo Terra e que não quiseram ser identificados afirmam que o clima de revolta atinge familiares das supostas vítimas e moradores da cidade.

De acordo com um dos entrevistados, a prisão de Gaievski em Curitiba é vital para segurança do ex-assessor. “Não sei como vão reagir as pessoas se ele for trazido para cá. Vai ter que vir muitos policiais para proteção. O povo aqui é humilde e trabalhador e se sentiu traído pelo ex-prefeito. Os pais de algumas meninas então, nem se fala, no que podem fazer”.

“Já havia comentários há vários anos aqui sobre esses crimes contra menores e ele sempre pregava o moralismo. Está todo mundo chocado e só fala nisso aqui. Vai demorar para as pessoas se recuperarem”, disse uma vereadora.

Familiares de Gaievski, que é casado, deixaram a cidade logo após o anúncio da decretação de prisão preventiva do ex-assessor e não retornaram ao município. Dois filhos dele teriam pedido demissão de empregos na prefeitura. Um dos rapazes era concursado.

Relativização
A tese de defesa apresentada pelos advogados que defendem Gaievski foi concebida originalmente pelo advogado Paulo de Souza Queiroz, que exerce o cargo de procurador regional da República em Brasília.

O texto encaminhado ao TJ-PR foi extraído de um artigo de Queiroz que aborda a relativização da presunção de vulnerabilidade no estupro. No artigo, Queiroz questiona se a vulnerabilidade de menores de 12 anos é relativa ou absoluta, como determina o artigo 217-A do Código Penal, em seu inciso primeiro.

O texto da lei define que o menor de 14 anos não atingiu a maturidade suficiente para decidir sobre o próprio comportamento sexual e que por ausência de discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. O procurador defende “que ao menos em relação a adolescentes (maiores de 12 anos), é razoável admitir-se prova em sentido contrário ao estado de vulnerabilidade”.

Queiroz assevera que “por vezes tais relações, como namoros, ocorrem com o conhecimento e anuência dos próprios pais ou responsáveis pelos indivíduos tidos por vulneráveis”.

No entendimento do procurador, “a iniciação sexual na adolescência não é necessariamente nociva, motivo pelo qual a presumida nocividade constitui, em verdade, um preconceito moral”.

Consultado pelo Terra, o procurador preferiu não se manifestar sobre o uso de sua tese no caso específico envolvendo Gaievski.

No entanto, ele afirma que sua tese em princípio é legítima de ser evocada quando se trata de relações afetivas e/ou sexuais entre crianças e adolescentes ou ainda nas relações entre casais de namorados.

Queiroz sustenta, porém, que a relativização não deve ser considerada em casos envolvendo “incapazes que exerçam a prostituição, uma vez que, em geral, são crianças e adolescentes que estão numa situação de maior vulnerabilidade social/material, e por vezes com histórico de abuso sexual, a justificar, plenamente, o reconhecimento do crime de estupro por parte de quem, aproveitando-se dessa condição, pratica conjunção carnal ou ato libidinoso com tais pessoas”.

Abandonado
Enquanto aguarda a interposição de novos recursos de seus advogados, Gaievski permanece preso preventivamente em uma unidade policial em Curitiba.

Pessoas com acesso à cela onde ele está detido, disseram ao Terra que o ex-assessor teria adotado uma postura diferente após a Justiça paranaense negar seu pedido de liberdade.

Anteriormente, Gaievski demonstrava certa tranquilidade e crença na sua soltura. Após a decisão judicial, ele passou a apresentar um quadro de depressão e estaria inconformado por ter sido abandonado por pessoas que fariam parte de seu relacionamento diário.

O ex-assessor é acusado de prática de quase 40 crimes envolvendo estupro de vulnerável, estupro qualificado, assédio sexual e assédio sexual qualificado. Gaievski também foi denunciado pelo delito de responsabilidade de prefeito municipal, já que teria oferecido cargos na prefeitura de Realeza em troca de encontros sexuais.

Procurados, advogados que defendem Gaievski se recusaram a falar sobre o caso, alegando que o processo está sob sigilo de justiça. Eles informaram apenas que confiam na inocência do cliente e que deverão apresentar novos pedidos para libertação do ex-assessor.