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Caso Dantas: a mídia do banqueiro e o banqueiro da mídia

Caso Dantas: a mídia do banqueiro e o banqueiro da mídia

Por Marcelo Salles, no blog Fazendo Media

Vejam o que diz o jornalista Luis Nassif, em seu blog: O relatório do delegado Protógenes Queiroz, encaminhado ao Juiz Fausto Martin de Sanctis — que serviu de base para o pedido de prisão de Daniel Dantas e outros réus — acusa diretamente as revistas IstoÉ Dinheiro e Veja e os jornalistas Leonardo Attuch, Lauro Jardim e Diogo Mainardi de colaborarem com uma organização criminosa. Mainardi é explicitamente apontado como ”jornalista colaborador da organização criminosa”.

Há outros. Paulo Henrique Amorim publica matéria com algumas páginas do relatório da Polícia Federal que indicam contatos freqüentes de outros jornalistas com o especulador Naji Nahas, preso junto com Dantas na Operação Satiagraha: Vera Brandimarte (Valor Econômico), Paulo Andreoli e Tomaz Talman (revista Época), Elvira Lobato e Guilherme Barros (Folha de S.Paulo), Jony Saad (Band) e Roberto D´Ávila. Este último, segundo a PF, teria recebido R$ 50 mil para divulgação de opinião favorável ao Grupo Opportunity. Fato que demonstra “a capacidade da organização criminosa em manipular as notícias que são divulgadas pela mídia” (página 226).

Importante: manter contato com especuladores, bandidos, criminosos e ladrões não é crime, sobretudo em se tratando de jornalistas, que estão atrás de informações. Crime é vender espaço editorial sem avisar ao público que se trata de propaganda. Neste sentido, o delegado Protógenes assinala: “é comum os jornalistas acima citados assinarem matérias favoráveis aos interesses do Grupo Opportunity, principalmente à pessoa de Daniel Dantas”.

Este motivo seria suficiente para que o conselho da categoria abrisse processo de expulsão e cassação do diploma dos referidos jornalistas, caso existisse tal entidade. No Brasil, se um médico comete um erro ele pode ser impedido de praticar a profissão. O mesmo ocorre em outras profissões, mas não no jornalismo.

Da última vez que se tentou criar um conselho, em 2005, as entidades patronais e as corporações de mídia torpedearam a proposta até derrubá-la. Lembro da Zileide Silva, da TV Globo, levantar um troféu Comunique-se e afirmar, a plenos pulmões: “Nós não precisamos de um Conselho; nós já sabemos fazer jornalismo”.

Não discuto a competência do jornalismo praticado por Zileide, mas é bom frisar que nosso entendimento de jornalismo é outro. A começar pelo juramento profissional: ”A Comunicação é uma missão social. Por isto, juro respeitar o público, combatendo todas as formas de preconceito e discriminação, valorizando os seres humanos em sua singularidade e na luta por sua dignidade”.

Esse não é o jornalismo da Globo, que esteve ao lado da ditadura política e hoje serve à ditadura financeira que deixa 72 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar – o eufemismo que o IBGE encontrou para a fome –, milhões de desempregados e outros tantos sem acesso à Saúde e à Educação de qualidade.

Não nos causa surpresa a ligação das corporações de mídia com o esquema de Daniel Dantas. Como temos insistido nos cinco anos de Fazendo Media, a mídia, hoje, é a instituição com maior capacidade de produzir e reproduzir subjetividades, ou seja, de determinar formas de agir, sentir, pensar e viver de cada indivíduo e, por conseguinte, de toda a sociedade.

Não por outro motivo organizações criminosas como a liderada por Daniel Dantas, ou governos terroristas como o dos EUA, procuram apoio na mídia. Eles sabem que para tocar seus negócios e suas guerras precisam de alguma aprovação popular. Quando o delegado da Polícia Federal cita as revistas Veja e IstoÉ Dinheiro, ele aponta não apenas para o carro-chefe da editora Abril e para a publicação da editora Três.

O relatório de Protógenes encaminhado ao juiz Fausto Martin de Sanctis enquadra todas as corporações de mídia, posto que o modus operandi desses veículos é exatamente o mesmo, e coincide com o das empresas capitalistas que elogiam: o lucro acima de tudo, inclusive da vida. O fato de um ou outro veículo deixar rastro importa menos que sua orientação editorial, esta sim determinante para a manutenção de um sistema que permite — e se reproduz com — a existência de máfias privadas no controle da administração pública.

Daí a importância da construção de veículos de comunicação comprometidos com o interesse público, que sejam capazes de elaborar uma narrativa própria e que possam respeitar o juramento profissional dos jornalistas. Só assim poderemos entrar na disputa das representações com alguma possibilidade de trazer a hegemonia para o lado daqueles que defendem a vida acima de tudo, inclusive do lucro.