Arquivos

Categorias

O dia em que faltou cerveja no Sudoeste do Paraná

O jornalista Adolfo Pegoraro levou as páginas do Jornal de Beltrão neste sábado (30) um intrigante apanhado sobre a realidade política e social do Sudoeste do Paraná, da metade da década de 1980.

Com base em pesquisa nas edições antigas do jornal Correio de Notícias de 1986, Pegoraro relembra detalhes da população dos principais municípios da época, em contraste com os dados revelados esta semana pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Naquele ano, o Sudoeste elegeu 11 deputados, recorda o jornalista. Mas o detalhe que mais lhe chamou a atenção é o que dá título a este artigo, que segue na íntegra:

*

“Gosto muito de pegar jornais antigos da região para conhecer um pouco mais da história do Sudoeste. Esta semana, no museu do Jornal de Beltrão, resolvi folhear o jornal Correio de Notícias, que tinha uma sucursal na região na década de 1980.

Passei uma noite olhando as notícias do ano de 1986. Vários acontecimentos marcaram a região. O primeiro assunto que me chamou a atenção foi que a população do Sudoeste, naquele ano, segundo o IBGE, era de 668.076 habitantes – hoje são 585.693.

Eram somente 29 municípios, pois a outra parte ainda não tinha se desmembrado. Chopinzinho, por exemplo, tinha 41.784 habitantes, bem mais que os 19.635 de hoje. Mas é que Saudade do Iguaçu e Sulina se emanciparam e levaram uma fatia da população. Francisco Beltrão tinha 57.883 habitantes, Pato Branco contava com 54.528, e Dois Vizinhos, 50.941.

Outra notícia de 1986 que chamou a atenção foi que o Sudoeste elegeu 11 deputados: Nilso Romeu Sguarezi (Pato Branco), Euclides Scalco (Francisco Beltrão), Luis Carlos Borges da Silveira (Pato Branco), Alceni Guerra (Pato Branco), Caíto Quintana (Planalto), Nereu Massignan (Dois Vizinhos), Lauro João Lobo Alcântara (Pato Branco), João Batista de Arruda (Francisco Beltrão) e Pedro Irmo Tonelli (Capanema). Foi uma festa!

No esporte, o destaque de 1986 foi o Pato Branco Esporte Clube, campeão da segunda divisão do Campeonato Paranaense. A equipe conseguiu uma vitória suada contra o Umuarama, na final, e faturou o caneco.

O União, de Francisco Beltrão, também disputou aquela competição, mas não obteve o mesmo sucesso. Opalas, Brasílias, Fuscas e outros veículos clássicos da época fizeram uma grande carreata em Pato Branco.

Sinceramente, o Sudoeste pode voltar a ter quase 700 mil habitantes, fazer até mais que 11 deputados e ficar campeão paranaense da segunda divisão novamente. Mas teve uma notícia que me chamou muito a atenção naquelas edições do Correio de Notícias.

Algo que jamais acontecerá novamente no Sudoeste. Praticamente uma tragédia, os sudoestinos não tinham mais motivos para sorrir, qualquer tentativa de riso era completamente apagada pelo silêncio, que prevalecia.

Os 29 municípios da época estavam cabisbaixos, sem vontade de comer uma bela polenta. Calma, vou explicar. A manchete do jornal naquela edição era assim: “Falta cerveja no Sudoeste”. Na matéria, fotos de uma gôndola de supermercado, onde geralmente ficavam as garrafas de cerveja, completamente vazia.

Chocante! “A partir da zero hora de 3 de dezembro, quarta-feira, a cerveja e o chope tiveram seus preços aumentados em 100%. No caso da região Sudoeste, que recebe cerveja da Antártica, Brahma, Kaiser e Skol, haverá um acréscimo devido ao frete.

O preço poderá ficar entre Cz$ 18 e Cz$20, de acordo com a distância da cidade até a fábrica.” Assim relatava, tristemente, o Correio de Notícias de 11 de dezembro de 1986. Talvez a notícia mais triste da história do Sudoeste.

Eu nem faço ideia de quanto seja 20 cruzados, mas imagino que seja bastante, pois a crise foi generalizada. Por esses motivos que fico aliviado de ter nascido somente em 1987. Não sei como seria superar uma atrocidade sanguinária como essa.

Deixar a população sem a geladinha é muito triste. Praticamente um descaso com a felicidade. Sorte que isso aconteceu depois da eleição e do título do Pato Branco. Caso contrário, não teria graça alguma comemorar os 11 deputados eleitos e o troféu da segunda divisão.

Conversando com algumas pessoas que viveram aquela época, descobri que os jornalistas foram os que mais sofreram. Estavam deprimidos. As redações de jornais não tinham motivação, pois ninguém podia redigir.

As rádios só tocavam músicas, pois os locutores não tinham o que falar. Portanto, fica aqui registrado o meu sentimento a essas pessoas, que sofreram tanto no passado.

Adolfo Pegoraro é jornalista do Jornal de Beltrão.”