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A realidade ambiental brasileira

 

Temas urbanos de meio ambiente ainda trazem resultados muito prejudiciais ao País

RICARDO SALLES*, O Estado de S.Paulo

Na semana em que se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente, os brasileiros têm muito o que celebrar e de que se orgulhar. Somos o país de dimensões continentais que mais preserva o meio ambiente, sobretudo quando analisada a realidade do campo e das nossas florestas.

O mesmo não se pode dizer, contudo, com relação ao que se passa nas cidades. Por um lado, temos um agronegócio que preserva e produz de maneira sustentável, recuperando as áreas de preservação permanente, estabelecendo as reservas legais determinadas pelo Código Florestal e trabalhando segundo as melhores práticas de manejo do solo e com as mais avançadas técnicas de produção. É verdade que existem questões, como o uso da água e de defensivos, que podem sempre ser melhoradas e, ainda, casos pontuais de alguns produtores que não souberam adequar-se às novas práticas de produção sustentável. São eles, entretanto, exceção. A grande maioria dos produtores brasileiros é amiga do meio ambiente.

Nossos exemplos no setor de energias renováveis, consagrando fontes limpas e renováveis como a eólica, a hidráulica e a solar, complementam-se por uma opção do etanol, com seu revolucionário RenovaBio. Nossas florestas plantadas, que crescem a cada ano, dão exemplo de modelo de produção que contribui para a recuperação de áreas degradadas, captura de carbono e fonte de biomassa para energia e madeira sustentável.

Nosso Código Florestal é exemplo de legislação pacificadora das visões de agro e meio ambiente, que são complementares e interdependentes. Sobre o cumprimento do Código Florestal na sua plenitude, com mecanismos de reconhecimento de áreas consolidadas e de regularização dos passivos ambientais suficientes e adequados para dar solução a essa falsa dicotomia, a discussão no Judiciário e fora dele contra os dispositivos do art. 68 em nada contribuiu para o meio ambiente.

Com relação às nossas florestas nativas, não há dúvida de que precisamos controlar o desmatamento ilegal, adotando técnicas e estratégias eficientes. Mas não podemos deixar de reconhecer que o Brasil é, dos países continentais, aquele que mais preserva a sua rica biodiversidade e que manteve em pé a maior parte de sua cobertura vegetal de florestas. É preciso notar, ainda, que, sem dar o devido dinamismo econômico aos povos e à região da floresta, permitindo que todos possam desenvolver suas atividades de produção sustentável e de manejo florestal, com aprovação dos zoneamentos econômicos ecológicos, com a devida análise dos pedidos de licenças de produção e da necessária regularização fundiária, não haverá sistema de comando e controle que possa dar conta de pacificar e manter conservado aquele patrimônio de biodiversidade do povo brasileiro.

Para tanto, não se tem medido esforços, procurando novas tecnologias, estratégias e ações com inteligência e objetividade. Nesse sentido, o Brasil, neste governo, não apenas permaneceu no Acordo de Paris, como manteve inalterados todos os seus compromissos assumidos nas gestões anteriores, bem como todos os programas e ações relacionados ao combate e mitigação das mudanças climáticas. A isso se somam os esforços pelo recebimento das compensações financeiras, da ordem de US$ 100 bilhões, prometidas aos países em desenvolvimento, em especial ao Brasil, aquele que mais fez e faz pelo meio ambiente. Nossas emissões não atingem 3% do total mundial, mas nem por isso o País tem se furtado de avançar em medidas que contribuam para controlar e mitigar os seus efeitos.

Somam-se a isso as nocivas consequências da inação, até hoje, nos temas ambientais urbanos, que, além de contribuírem negativamente para os efeitos das mudanças climáticas, trazem resultados extremamente prejudiciais aos brasileiros, sobretudo os cerca de 80% da nossa população que vivem nas cidades. O País apresenta índices vergonhosos de coleta e tratamento de esgoto, permitindo a proliferação de doenças e a destruição de nossos corpos hídricos pelo despejamento de tanta poluição in natura em nossos rios e no oceano. Trata-se, portanto, de tema prioritário para a saúde, para a qualidade de vida e para o meio ambiente. Da mesma forma, a triste situação da gestão dos resíduos sólidos e do lixo em praticamente todos os municípios do Brasil é fato que não tem tido quase nenhuma atenção de nossos órgãos ambientais, nas diversas esferas. Uma vergonha nacional o estado em que se encontram os lixões e aterros no País.

A saída passa, necessariamente, pela coleta seletiva obrigatória, a começar nas grandes cidades, pela reciclagem, feita de maneira estratégica e realista, pelo aproveitamento energético dos resíduos, compostagem, economia circular, logística reversa e destinação adequada. No tema dos resíduos e do lixo, não há solução mágica e todas as ações devem reconhecer as diferenças regionais, econômicas e logísticas em nosso território, conforme previsto no já lançado Programa Lixão Zero.

A qualidade do ar nas grandes cidades do Brasil também não nos anima. É tema extremamente relevante para a saúde pública e para o meio ambiente. Algo efetivo e realista precisa ser feito, e rápido, e o Ministério do Meio Ambiente elencou também este tema entre as prioridades da Agenda Nacional de Qualidade Ambiental Urbana, que prevê, ainda, ações de aumento das áreas verdes em perímetros urbanos, recuperação de áreas contaminadas e, por fim, não menos importante, as ações do programa já em andamento de combate ao lixo no mar.

A reestruturação do Ibama e do ICMBio passa por planejamento, informatização, por suas equipes, frotas e instalações, que serão coroados com o fortalecimento e a consolidação das nossas Unidades de Conservação, com a solução de conflitos de regularização fundiária e medidas de incentivo e parcerias e concessões privadas para termos novas e boas estruturas, programas de conservação e aumento da visitação pública, em benefício de toda a sociedade e do meio ambiente.

* RICARDO SALLES É MINISTRO DO MEIO AMBIENTE