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Economia volta a se deprimir

Economia volta a se deprimir

País ficou estagnado no 1º trimestre; dólar e juros do BC não explicam lerdeza

Vinicius Torres Freire

O dólar e a decisão do Banco Central de não mexer na taxa de juros vão dar algum pano para a manga. Mas a economia está um trapo por algum outro motivo mais sério. Trapo: o país não cresceu no primeiro trimestre, segundo a estimativa do Banco Central.

Em abril, foram para o vinagre as medidas de confiança de consumidores e empresas. Azedaram uns indicadores importantes de perspectivas de emprego e crescimento, da FGV. Não são animadoras medidas parciais do movimento no comércio em maio, feitas por bancos e grande varejo.

Mês a mês, o indicador de crescimento calculado pelo BC não é lá muito preciso. Na medida do crescimento em 12 meses, fica melhor. Pois bem. Até dezembro, o crescimento anual medido pelo IBC-Br havia sido de 1,04%. Até março, foi de 1,05%.

As expectativas para o resto do ano pioraram. A FGV tem um índice que tenta captar a direção do vento, o Índice Antecedente Composto da Economia, o Iace. Parou de ventar.

“Após nove meses de altas seguidas, o Iace recuou em abril com os componentes de expectativas captando o sentimento de frustração em relação ao ritmo da retomada econômica”, disse o economista Paulo Picchetti, pesquisador do Ibre da FGV, na divulgação do indicador, na terça-feira (15).

O Índice Antecedente de Emprego da mesma FGV recuou pela segunda vez consecutiva em abril, sinal de que a recuperação no mercado de trabalho deve ficar ainda mais lenta. A Fiesp também notou desaceleração no emprego industrial em São Paulo.

O resultado oficial do PIB do primeiro trimestre sai apenas no fim deste mês. Os dados mensais de março e abril ainda são parciais. Mas está difícil de encontrar um setor em que a discreta animação do final de 2017 não tenha se dissipado.

Essa recuperação depende apenas de consumo: de salários e crédito a bom preço. Há problemas visíveis nesses motores.

O crescimento do total de rendimentos do trabalho baixou a 1,8% ao ano. Andava crescendo entre 3,5% e 4,5% ao ano entre setembro e dezembro de 2017. Em parte, essa alta do ano passado parece agora ilusória. Em parte, o efeito da baixa rápida e surpreendente da inflação sobre os salários também passou. Além do mais, as taxas de juros nos bancos mal se movem desde o fim do ano passado.

As empresas estão na retranca. O emprego formal ainda regride, a renda extra vem de trabalho precário e mal pago. O setor de serviços ainda está em recessão, atolado em especial por causa da baixa demanda das empresas. A construção civil chegou ao fundo do poço, mas lá permanece, desfalecida, pois o investimento público em obras ainda diminui.

Dada essa situação, não faria muita diferença se o Banco Central tivesse cortado a taxa de juros em 0,25 ponto percentual nesta quarta-feira (15). Caso a recuperação permaneça nessa lerdeza exasperante, com inflação de resto fazendo um aniversário abaixo do piso da meta, o BC pode mudar de direção, embora então passe um discreto vexame e tenha de talhar a Selic com mais vontade.

Obviamente não foi o dólar em alta que prejudicou o desempenho do primeiro terço do ano. Provavelmente, será um bode expiatório fraco caso a recuperação continue devagar quase parando.

Como está quase todo o mundo meio desnorteado, sem saber até onde vai o dólar e seu efeito na inflação, a decisão conservadora do BC pode ser tolerável. Mas, resumo da ópera, apenas 0,25 ponto percentual a mais ou a menos de Selic não vai nem remediar o nosso problema de economia deprimida.