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O ajuste fiscal e as universidades

O ajuste fiscal e as universidades

Lafaiete Neves

O ajuste fiscal do governo Dilma fará um corte de R$ 70 bilhões no orçamento federal, com redução de recursos atingindo os 39 ministérios. O impacto será imediato na infraestrutura, atingindo em cheio o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em R$ 65,6 bilhões. Outro importante programa federal, o Minha Casa, Minha Vida, também foi afetado, passando de R$ 19 bilhões orçados para R$ 13 bilhões a serem executados. Isso significa um forte freio na construção de habitação para milhares de famílias de baixa renda sem moradia própria.

Na atividade agrícola, principalmente para os pequenos agricultores, a redução foi pesada, com um corte de quase 50%, caindo de R$ 3,7 bilhões para R$ 1,8 bilhões. Um setor estratégico e fundamental para o desenvolvimento do país como a saúde teve uma redução para R$ 91,5 bilhões.

Na área da educação, o corte foi o mais pesado. Segundo dados do Tesouro Nacional, chega a R$ 10 bilhões. Isto, na prática, significa o abandono do objetivo maior da campanha eleitoral da candidata Dilma, o “Brasil: pátria educadora”, dada a queda de investimentos na educação, que apenas no perído de janeiro a abril de 2015 caiu de R$ 3,7 bilhões para R$ 2,17 bilhões.

O efeito é imediato também para o setor privado da educação, que hoje se beneficia de recursos transferidos do orçamento público. Houve redução pela metade do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) – que no mesmo período de janeiro a junho de 2015 deixou de financiar as mensalidades de 252 mil alunos –, cujo total em 2014 era de 480 mil alunos. Outro programa de transferência de recursos públicos para o setor privado da educação e que foi durante afetado foi o Prouni , que tinha no ano passado 191 mil alunos e, em 2015, aumentou para 213 mil alunos.

O ajuste fiscal tem afetado profundamente as universidades públicas, com cortes drásticos no custeio e capital, obrigando à paralisação de obras nos câmpus universitários, e causando falta de material de pesquisa. O MEC acaba de anunciar aos reitores um corte para a pós-graduação (mestrados e doutorados) no total de 75%, o que afetará de imediato a continuidade dos cursos de pós-graduação, com o corte de bolsas de pesquisas para docentes e estudantes no Brasil e no exterior, principalmente no momento de maior valorização do dólar, o que dificultará a sobrevivência de milhares de pesquisadores que estão fora do país.

Os burocratas de Brasília parecem não saber distinguir as áreas que devem ser preservadas no momento de maior crise econômica nacional e internacional. Desmontar a pesquisa e a pós-graduação interessa a quem objetivamente? Sem dúvida alguma, aos interesses internacionais, pois na retomada do crescimento, com o corte de investimentos em pesquisa e pós-graduação, perderemos o avanço que temos na pesquisa básica e aplicada; sem novas tecnologias e patentes, aumentaremos a nossa dependência do mercado internacional. Isso significa que teremos de exportar mais commodities para importar menos tecnologia, dados os preços desiguais nas trocas internacionais. Isso implica em uma regressão e, o pior, as pesquisas interrompidas não serão retomadas com facilidade. Esses tecnocratas do Ministério da Fazenda demonstram que preferem preservar ministérios com menos peso no desenvolvimento econômico do país, como o da Defesa.

Na verdade, o objetivo desse ajuste fiscal está bem explicito: é aumentar o superávit primário, menos despesas do governo, aumento da arrecadação com mais impostos, para pagar os juros exigidos pelos banqueiros, que vivem sangrando quase a metade do orçamento federal. Em nome desse objetivo, sacrifica-se o bem máximo do país, que é a educação. Essa política determinada pelo rentismo financeiro está encontrando na sociedade uma reação que cresce, manifestada pelos movimentos de greve dos servidores públicos em todos os níveis.

Categorias importantes do serviço público – como os professores das universidades federais, servidores do INSS, técnico-adminstrativos das universidades – deflagaram greves que estão se ampliando como forma de enfrentamento aos cortes drásticos de recursos para a educação e reposição de quadros técnicos na previdência social.

O governo continua intransigente, sem abrir negociações com os servidores públicos federais, e ao mesmo tempo se mostra dócil ao baixar medida provisória autorizando a redução de salários na indústria com a cobertura do Fundo de Garantia pelo Tempo de Serviço (FGTS), que irá repor R$ 900 por trabalhador que vier a ter seu salário reduzido. É contraditória tal política diante dos cortes em setores estratégicos para o país, como educação, saúde e habitação, que não tiveram nenhuma medida compensatória.

Lafaiete Neves é professor aposentado da UFPR, é doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR e pesquisador da linha de pesquisa Economia Política do Poder.