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Pior que a pena!

Elias Mattar Assad

Processos criminais, civis ou administrativos, são piores que as penas!

A mera investigação é, moralmente, pior que a pena. A denúncia e o processo e as quase sempre prisões imediatas, são piores que as penas. As penas e suas execuções no Brasil, são piores que as penas previstas em leis. Tudo vira “escândalo” (parodiando Rita Lee). Culpado ou inocente, meramente “ser réu”, é pior que a pena. Trago esta reflexão para abrir 2019:
Ser réu no processo…

Recebi do colega advogado Marco Aurélio Costa Moreira de Oliveira, seu livro intitulado “Justiça e ética – ensaios sobre o uso das togas”, onde registra suas impressões a respeito do “dever ser” dos operadores do direito. Com observações extraídas ao longo da sua trajetória frente ao Ministério Público, magistratura (ex-desembargador TJRS), meio acadêmico (professor de ciências penais da UFRG) e laureado integrante da OAB-RS, ninguém melhor credenciado para as oportuníssimas e lúcidas abordagens neste período de trevas.

Dele extraímos: “Nos casos judiciais, o demandado, mesmo da maior respeitabilidade e sem qualquer culpa, seja quem for, tenha ou não razão, é chamado de réu… Afinal, a palavra réu consta na lei e no processo escrito com letras frias, em um pedaço de papel, sem retratar a alma e os sentimentos de uma pessoa.

Até pode ocorrer que, sem maldade ou sem a intenção de denegrir, o juiz, ao ditar sua sentença, o Ministério Público, ao proferir seu parecer, e o advogado adversário, ao acusar, pronunciem a palavra “réu”, como se esta retratasse uma simples posição na cena do processo, sem atentar para o malefício moral que ela causa a um demandado a quem se impõe o ônus de carregá-la por muito tempo… pesarosamente.

Ser um simplesmente réu já representa uma condenação moral, pelo menos socialmente. A pecha seguirá a sua pessoa, culpada ou inocente, de forma duradoura com toda a sua conotação social e emocionalmente pejorativa, até mesmo em processos cíveis. Por isso, seria preferível a designação “demandado”.

Em um processo de majoração de alimentos, entre partes de marcante notoriedade social, o filho mais velho do casal, um bem-sucedido profissional liberal, que subira em sua carreira graças ao prestígio do pai, durante seu depoimento, refere-se a alimentada como “mãe” e ao alimentante como “réu”.

Essa palavra era usada com manifesta intenção de diminuir alguém que lhe proporcionara a educação universitária e o lançara em exitosa carreira que ambos haviam abraçado. Saindo da audiência, o alimentante afiança a seu patrono que o epíteto “réu” significou para ele a mais dolorosa das condenações, justamente proferida por seu próprio filho, de modo impiedoso e irrecorrível…”

Suas observações a respeito das carreiras de juiz, promotor, advogado, professor e mesmo sobre a fase inicial de aluno, são incomparáveis. Ao parabenizar o autor, deixo claro que é um livro que eu me arriscaria para, entre tantos, salvá-lo de um incêndio em minha biblioteca…

Elias Mattar Assad – advogado e presidente da Abracrim – Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas. Escrita em 2007 “Sementes de Novas Teses”, Editora Lex.