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Educação e desenvolvimento

Setores que empregam muita tecnologia, como os de petróleo, gás, biocombustível, microeletrônica, nanotecnologia e comunicações, eram e continuam sendo os que mais sofrem com a escassez de profissionais

Editorial, Estadão

Em seu mais recente levantamento sobre educação, abrangendo 46 países, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou um dos principais gargalos para a modernização da economia brasileira. Trata-se do baixo número de graduados em ciências, engenharia e matemática, comparativamente aos números dos demais países avaliados.

Segundo a OCDE, somente 17% dos brasileiros diplomados no ensino superior formaram-se nessas áreas. Apenas Argentina e Costa Rica ficaram em situação pior do que o Brasil, com um índice de 14%. Nos países desenvolvidos, a média é de 24%. Os dados coletados são de 2015. No ano anterior, o Brasil tinha 600 mil engenheiros, o equivalente a 6 profissionais para cada mil trabalhadores. Nos Estados Unidos e no Japão, a proporção era de 25 engenheiros por mil trabalhadores, segundo a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.

Por isso, setores que empregam muita tecnologia, como os de petróleo, gás, biocombustível, microeletrônica, nanotecnologia e comunicações, eram e continuam sendo os que mais sofrem com a escassez de engenheiros, cientistas e matemáticos. A situação é tal que, nos últimos anos, a falta de profissionais qualificados em ciências exatas levou bancos a pagar altos salários a matemáticos recém-formados para trabalhar em atividades exercidas por especialistas em engenharia financeira, como análise de risco, modelagem, precificação e uso de plataformas de investimentos com base em algoritmos. Além disso, entre os engenheiros que trabalham nas áreas mais complexas, muitos dominam as tecnologias em vigor, mas não têm preparo para acompanhar o desenvolvimento de tecnologias de ponta.

O estudo mostra que, apesar de o Brasil ter aumentado os investimentos em ensino superior, as áreas mais privilegiadas foram Direito e Administração, de menor impacto na modernização da economia. Do total de graduados, 36% diplomaram-se nessas áreas, enquanto a média da OCDE é de 24%. “O que enriquece um país é a boa engenharia e a boa ciência. Só assim se consegue pensar em soluções inovadoras, que vão fortalecer a economia. Ainda não temos essa cultura e outros países já entenderam isso há muito tempo”, afirma Leandro Tessler, do Instituto de Física da Unicamp.

Para mudar essa cultura, as agências de fomento e o Ministério da Educação lançaram nas últimas décadas programas destinados a formar número suficiente de graduados em ciências exatas para atender à demanda que surgirá nas áreas de ponta, quando a economia voltar a crescer. O problema é que a má qualidade do ensino básico tem afastado os estudantes dessas áreas. Na última edição do Programa Internacional de Avaliação de Alunos, que é promovido pela OCDE, os alunos brasileiros tiveram baixo desempenho em matemática e ciências. As médias dos estudantes dos países da OCDE foram de 490 e 493 pontos, respectivamente, enquanto as dos estudantes brasileiros foram de 377 e 401.

Os números mostram que, antes de estimular as novas gerações a optar por ciências, engenharia e matemática no vestibular, as autoridades educacionais precisam melhorar a qualidade do ensino básico. De nada adianta ampliar o número de vagas nas áreas de ciências exatas do ensino superior, se não há demanda qualificada de estudantes preparados para ocupá-las. Na primeira metade da atual década, das 302 mil vagas oferecidas pelas escolas de engenharia, apenas 120 mil estavam preenchidas. É justamente esse o equívoco apontado pela OCDE: apesar de o Brasil investir 5,5% do PIB em educação, o que é proporcionalmente maior que a Alemanha, que investe 4%, os recursos são mal aplicados. Ou seja, gasta-se muito com o ensino superior, quando se deveria priorizar o ensino básico. Gasta-se muito em ciências humanas, em detrimento da área de ciências exatas. Como pode assim o Brasil se desenvolver, sem redefinir as prioridades com gastos em educação?